Artigo: Fundo Eleitoral, a injustiça com o dinheiro público

As eleições municipais de 2020 refundaram antigas patologias da nossa democracia. Financiadas basicamente com recursos públicos do Fundo Eleitoral, as campanhas de vereadores e prefeitos tiveram como “padrinhos” os chamados caciques partidários.

Ao invés dos recursos serem repassados diretamente aos candidatos, de forma equânime e igualitária, os partidos acabaram por direcionar vultuosas verbas para deputados federais, senadores e dirigentes que comandam as siglas nos seus respectivos redutos eleitorais.

Uma espécie de triangulação do dinheiro público ou carimbo que reforça a figura do “coronel”. Estes, por sua vez, ficaram responsáveis pela escolha de quem e quanto cada um iria receber.

Aqui observamos duas aberrações. A primeira, mais óbvia, se refere ao fato desse mecanismo impedir a renovação orgânica dos quadros partidários. Se você não for do mesmo grupo do político endinheirado dificilmente conseguirá ter acesso ao fundo e fazer uma campanha com uma melhor estrutura.

A segunda aberração se refere ao fato desse sistema funcionar como “cabresto” político. Ou seja, eu te dou o dinheiro e você me apoia lá em 2022. Então, a triangulação do dinheiro público de campanha só fortalece os caciques regionais dos partidos, que acabam por fidelizar o apoio de vereadores e prefeitos à sua própria campanha. Mais uma vez sobra pouco espaço ou nenhuma brecha para a renovação.

Após fazer uma consulta à minha base eleitoral, eu decidi votar contra a criação do Fundo Eleitoral, justamente por não concordar que os já escassos recursos públicos que faltam à população sejam utilizados em campanhas políticas. Mas a maioria venceu e o Fundão de quase R$ 3 bilhões acabou sendo sancionado pelo presidente da República. E justamente por esse posicionamento, meu partido me puniu com o corte do Fundo Eleitoral. Mas a punição acabou prejudicando não a mim e, sim, a própria base partidária, que merecia receber igualitariamente tais recursos. Aí já entramos numa terceira aberração, que é a perseguição partidária contra os chamados “infiéis”, que discordam em certas votações por convicções diferentes da cúpula.

Há um outro aspecto a ser mencionado. Os candidatos dos partidos de esquerda, como PSOL, PC do B e PT, que pregam contra o sistema produtivo capitalista, receberam vultuosos recursos e se beneficiaram dos pagadores de impostos que eles mesmos combatem. Daqui a dois anos teremos eleições gerais e podemos esperar a repetição desses mesmos problemas se nada for feito. Precisamos rediscutir este sistema de financiamento, que reproduz os mesmíssimos vícios das doações empresariais, que num passado recente foram fonte de vários escândalos de corrupção. Devemos estabelecer novas regras de gestão e transparência do Fundo Eleitoral, onde o eleitor possa saber como será feita a distribuição e para quem. E oferecer condições de igualdade para que todos os candidatos tenham acesso. Afinal de contas, o dinheiro é público e tem origem nos impostos pagos por todos os cidadãos.

Deputado Federal Jerônimo Goergen (Progressistas-RS)